A tradição mantida há 35 anos pelo Balé Folclórico da Bahia (BFB), grupo que trabalha o folclore e a cultura popular, atuando na preservação e promoção da ancestralidade africana no Brasil e no mundo, ganhou novo fôlego, após o convênio firmado com a Prefeitura de Salvador. A companhia, que precisou suspender por completo as atividades durante a pandemia e por pouco não fechou definitivamente, por falta de patrocínio, entrou em nova fase, com os investimentos assegurados pelo Município.
No ano passado, o grupo voltou a enfrentar dificuldades para se manter apenas com os recursos da bilheteria, até que a Prefeitura anunciou, em maio último, um convênio que garante a destinação de R$380 mil para auxílio no custeio dos artistas, do administrativo, da manutenção do imóvel e do espetáculo, que é apresentado três vezes por semana, no Teatro Miguel Santana, no Pelourinho.
“Vai ser uma ajuda extremamente importante, principalmente depois de dois anos de pandemia e de um ano de retorno das atividades. É uma questão de necessidade, porque é a preservação da nossa cultura”, afirma Walson Botelho, conhecido como Vavá Botelho, presidente do Balé Folclórico da Bahia.
O Balé Folclórico da Bahia reúne balé clássico, dança contemporânea e técnica afro, em manifestações como o maculelê, samba de roda, capoeira e a puxada de rede. Além disso, os espetáculos trazem sempre uma parte da religiosidade, em que são trabalhadas as danças dos orixás.
“Essa parte da dança dos orixás nós não trabalhamos como folclore, pois o candomblé não é folclore, é uma religião que precisa ser respeitada, como qualquer outra. Nós trabalhamos a dança dos orixás como forma de desconstruir preconceitos e de prestar uma grande homenagem ao candomblé, que é uma das religiões mais bonitas e tradicionais da humanidade”, conta Vavá.
Apresentações – A companhia de dança se apresenta em espetáculos permanentes às segundas, quartas e sextas-feiras, às 19h, no Teatro Miguel Santana, na Rua Gregório de Mattos, 49, Pelourinho. O retorno das apresentações é uma iniciativa da Secretaria de Cultura e Turismo de Salvador (Secult) e do BFB, em articulação com empresas privadas e representantes do trade turístico, que passaram a se interessar pelo produto.
Além das apresentações fixas, o BFB realiza oficinas gratuitas e abertas para toda a população. As oficinas atualmente atendem uma média de 100 pessoas. Com o apoio da Prefeitura, a expectativa é que ela seja ampliada e alcance uma média de 800 pessoas. Além disso, o presidente do BFB planeja retomar o Balé Júnior, projeto que já atendeu cerca de 3 mil crianças e adolescentes, com idade entre 6 e 16 anos, formando novos talentos, para o Balé Folclórico e para o mercado.
Tradição – Vavá lembra que, quando foi criado por ele há 35 anos, havia pelo menos outros 10 grupos trabalhando o folclore baiano e apresentações regulares. Atualmente, apenas o Balé Folclórico da Bahia realiza esse trabalho. A ideia, inicialmente, era oferecer um espetáculo voltado aos turistas e eventos, mas hoje Vavá considera que o grupo tem um cunho social muito mais importante que o artístico cultural.
Em 35 anos, o grupo já realizou 7.488 espetáculos no Teatro Miguel Santana e cerca de 35 turnês internacionais. As apresentações passaram por 282 cidades, apenas nos Estados Unidos. Nesse período, mais de 800 bailarinos foram formados, mais de 80% continuam a atuar e grande parte deles representa o Brasil, em outros países.
Segundo Vavá, o balé atende à necessidade de Salvador ter a sua companhia de dança. “É uma forma de levar adiante todo um trabalho iniciado com Emília Biancardi, na década de 1960, com o objetivo de atuar na preservação, manutenção, pesquisa e promoção desses valores culturais, para a eternidade”, diz.
Diretor artístico do BFB, Zebrinha acrescenta que o BFB é o embaixador da cultura no Brasil. “É um lugar onde, além de serem preservadas as tradições, elas são ensinadas. A única maneira é fazer com que as pessoas assimilem e vivam essas tradições”, explica.
Amor à arte – O Balé Folclórico da Bahia conta hoje com 20 bailarinos, quatro músicos, duas cantoras, além de profissionais do administrativo e da área técnica, somando cerca de 50 funcionários. O grupo movimenta a economia do Pelourinho e Centro Histórico, atraindo turistas e gerando renda para comerciantes, que atuam na região.
Bailarino do BFB há 12 anos, Wagner Santana, de 32 anos, conta que integrar a companhia foi um sonho realizado. Desde que assistiu ao espetáculo ‘A Corte de Oxalá’, no Teatro Castro Alves, em comemoração aos 20 anos do grupo, se apaixonou e traçou o seu destino. “Eu comecei a estudar, a fazer aulas avulsas para ter o pique e a força para entrar no Balé Folclórico. Foi muito satisfatório quando eu consegui. Havia muita gente na seleção, mas eu consegui e fiquei muito feliz por começar a fazer algo que eu amo. A dança me sustenta de todas as formas”, destaca.
Graças à companhia, ele já dançou na Bélgica, mas diz que o momento mais marcante de sua carreira foi ter se apresentado no TCA. “Nada foi mais satisfatório que sentir o calor da minha terra, me assistindo em um lugar onde sempre almejei estar. O Balé Folclórico me diz quem eu sou, me ensinou o que é representatividade, me ensinou a entrar e sair dos lugares e me levou a lugares para onde nunca imaginei ir. É uma grande escola e uma grande casa para mim”, acrescenta.Gabriela Pequeno também é bailarina e entrou na companhia no ano passado. “É muito satisfatório fazer parte do BFB, que é uma companhia referência não só em Salvador, mas na região Nordeste e no estado da Bahia. É uma companhia que valoriza a religião de matriz africana e a cultura da nossa cidade e do nosso povo”, opina.