A Prefeitura de Salvador pretende, neste ano, aplicar 26 geomantas em encostas, além de incrementar no próprio parque tecnológico mais 20 estações pluviométricas e cinco estações meteorológicas. O objetivo é ampliar as iniciativas municipais de mitigação aos efeitos climáticos na cidade, que hoje é referência no país quando o assunto é política pública para o segmento.
Aliado aos investimentos, a Defesa Civil de Salvador (Codesal) intensificou as ações preventivas a fim de dar agilidade e efetiva resposta a eventuais desastres naturais através da Operação Chuva, ocorrida entre março e junho. O período é historicamente o de maior índice pluviométrico na cidade. Por meio da estratégia, a Codesal fez 5.651 mil vistorias em áreas de risco, um acréscimo de 15,8% em relação a 2022, quando foram realizadas 4.879 avaliações de campo. Isso mesmo em 2023 ter chovido menos.
Durante os quatro meses de operação, o acumulado de chuva na capital baiana foi de 881,8 mm, o que representa 9,3% abaixo da Normal Climatológica (972,0mm), segundo os registros da estação de referência do Inmet, em Ondina. Em 2022, choveu no mesmo intervalo 1.031,6 mm.
“Em 2023, choveu menos do que nos últimos três anos, quando houve chuvas fortes por conta da atuação da La Niña (fenômeno que provoca a diminuição da temperatura da superfície das águas do oceano). Já tínhamos essa previsão. Por outro lado, o El Niño trouxe aquecimento do oceano este ano, provocando chuvas rigorosas de forma pontual”, explica o diretor da Codesal, Sosthenes Macêdo.
Ele cita dois exemplos que ilustram isso: março chegou a contabilizar 123,8 mm de chuvas em três horas, e todos os dias de maio tiveram precipitações na cidade. “Essa constância gerava algumas situações e ocorrências. Porém, muitos dos esforços que nós realizamos de prevenção geraram uma sensação de segurança maior por parte da população, que hoje se sente acolhida com o trabalho da Prefeitura. Nos últimos oito anos, nós não vivenciamos mais tragédias em Salvador ”, avalia Macêdo
O sucesso, acrescenta o gestor, se dá após uma ampla reestruturação ocorrida na Codesal a partir de 2016. Foi a partir dali que a capital baiana ganhou um moderno centro de monitoramento de alerta e alarme (Cemadec) para avaliar o quadro evolutivo dos fenômenos climáticos extremos que oferecem riscos à população, funcionando 24 horas por dia, e também passou a ser beneficiada com soluções inovadoras, com destaque para as geomantas.
Já são 261 proteções do tipo implantadas em áreas de risco, trazendo segurança para mais de 5,8 mil famílias. As geomantas são tecnologias de cobertura provisória para impermeabilização das encostas formadas por um composto de PVC e geotêxtil com cobertura de cimento jateado de rápida instalação e baixo custo. Há 26 delas previstas para serem entregues este ano, sendo que 12 estão concluídas e quatro estão em curso.
A Prefeitura, através da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras Públicas (Seinfra), também executa contenções definitivas de cortina atirantada e solo grampeado. Mais de 150 delas foram construídas desde 2013 para cá.
“Ou seja, a Salvador de hoje tem mais de 500 intervenções novas que não tinham no passado recente, entre 10 a 13 anos atrás. Somada a essas intervenções físicas, conseguimos internalizar no soteropolitano a necessidade de ter uma boa relação com o meio ambiente. Não se fala mais em grandes deslizamentos que tomam vidas de dezenas de pessoas, como os que ocorreram no Barro Branco, Marotinho, Rua Coronel Pedro Ferrão, Arraial do Retiro, sobre o Motel Mustang, na Avenida Suburbana, entre outros que aconteciam décadas atrás”, compara o titular da Codesal.
Ele acrescenta que a pauta de mudanças climáticas não é algo para o futuro: “Já está no nosso presente. Tivemos aqui em Salvador chuvas de 100 mm em uma hora, até chuvas de granizo em 1º de janeiro de 2020, vendavais que arrancaram telhados de casas, avanço do nível do mar que rompeu contenções. As transformações climáticas, os extremos, não são mais uma peça de ficção que as pessoas achavam que era algo para o futuro. É uma realidade que já bateu à nossa porta”.
Confira ações realizadas ou previstas pela Codesal
Mais aparatos
“Para nosso parque tecnológico neste ano, adquirimos mais 20 estações pluviométricas que serão instaladas, somando-se a outros 74 equipamentos existentes. Essas estações têm a pretensão de quantificar o quanto choveu numa determinada localidade. Com isso, a gente consegue saber quantos milímetros de chuvas foram acumuladas em 30 minutos, 1h, 3h, 6h, 12h, 24h, 48h, 72h, 96h e no mês. Eu consigo ter um parâmetro de onde está mais vulnerável, cruzando com a quantidade de solicitações feitas pelo telefone 199”, diz Sosthenes.
“Também instalaremos mais cinco estações meteorológicas (a cidade já possui quatro). Como o nome sugere, esses equipamentos fazem uma análise meteorológica, da radiação do sol, da temperatura, da velocidade das rajadas de vento. Por exemplo, no último dia 4 de julho nós tivemos a noite mais fria do ano (20,6º C). A gente pôde ter essa informação porque fizemos monitoria de algumas estações meteorológicas aqui em Salvador, dentre elas a de Ondina (pertence ao Inmet) que nos apontou esse dado. Com essa nova aquisição de equipamentos de meteorologia, faremos instalação naquela região com a finalidade de acompanhar, junto com a Marinha do Brasil, o que é que está rolando de vento forte nas áreas de baía e de mar aberto para o continente. As tecnologias que nós estamos implementando são o que têm feito com que a nossa cidade seja cada vez mais resiliente e cada vez mais preparada”.
Parque tecnológico
“Quem nos orienta é o nosso próprio Centro de Monitoramento e Alerta da Defesa Civil de Salvador (Cemadec). Hoje contamos no nosso parque tecnológico com 74 estações pluviométricas, 15 estações geotécnicas, 14 sistemas de alerta e alarme, quatro estações meteorológicas e quatro estações hidrológicas. Antes de 2016, o acompanhamento acontecia numa escala Brasil, mas hoje os algoritmos, os modelos que são constituídos para acompanhar as projeções e previsão meteorológica são feitos por meteorologistas da Codesal com escala Salvador. Ou seja, conseguimos ter muito mais riqueza de detalhes e precisão local”, declara Macêdo.
Capacitações
“A Defesa Civil desenvolve durante todo o ano atividades educativas com crianças da Rede Municipal de Ensino, visando estimular a adoção de comportamentos de prevenção capazes de evitar ou minimizar os impactos provocados pelas chuvas. Temos hoje 10 mil crianças capacitadas. Elas vão se tornar jovens e adultos sabedores dessas mudanças climáticas e das suas responsabilidades com essa cultura internalizada em seus corações. Trata-se de uma ação que trará frutos a médio e longo prazo”, prevê o diretor da Codesal
“Além delas, temos 3 mil voluntários capacitados nos Núcleos Comunitários de Proteção e Defesa Civil (Nupdecs) e no programa Mobiliza. Os Nupdecs são realizados nos bairros que têm riscos geológicos e hidrológicos, levando aos moradores módulos com orientações de primeiros socorros, de percepção de riscos e de educação ambiental. O Mobliza é semelhante. A diferença é que os voluntários são capacitados aqui na sede da Codesal.”
Reforços
“Este ano iremos trazer para a Codesal mais 12 novos engenheiros civis via concurso público. Fizemos ainda seleção via Regime Especial de Direito Administrativo (Reda) de mais 10 engenheiros temporários, durante os últimos cinco meses, para podermos reforçar as equipes por conta das chuvas. Temos um corpo bem robusto de profissionais que vêm fazendo uma série de vistorias em áreas de risco geológico, seja através de chamadas pelo 199 ou avaliação diária. É um pessoal qualificado, com meteorologistas, estatísticos, geólogos, engenheiros civis, ambientais, agrônomos, arquitetos que fazem um trabalho de articulação e sobretudo de prevenção.”
Reconhecimentos
“Salvador foi certificada pelo escritório das Nações Unidas de Redução de Risco de Desastres como hub de resiliência neste ano. Hoje, a Defesa Civil utiliza do seu conhecimento, da sua expertise, do seu know-how, para formar outras Defesas Civis da Bahia e de outros estados. Os Nupdecs também foram destaques em publicação internacional pelo Grupo C40 de Grandes Cidades para a Liderança do Clima”, lembra Sosthenes Macêdo.